LEAVE BRITNEY ALONE (AGAIN)
ATÉ QUANDO BRITNEY TERÁ DE DIZER "CHEGA"?
Por M o u r a C e s a r
No ano jurássico - onde reza a lenda, até dinossauros ainda andavam entre nós - de 2007, apesar do SMS, MSN, Orkut e Facebook, tínhamos o primitivo hábito de nos falar ao telefone. Caso você leitor(a) não lembre, “falar ao telefone” é ter de ouvir toda a conversa sem ter a opção 2x, fast-foward ou "apagar conversa". Era dia 09 de setembro e como de costume estávamos eu e um amigo da época ao telefone, detalhando cada take da transmissão ao vivo do VMA’s (Vídeo Music Awards), bombada premiação de video-clipes da MTV. Filho da geração vídeo-clipe, o evento era meu ápice social do mês de setembro (perdendo só para meu aniversário). Como todas as garotas e bichas da época, estávamos ali para assistir ao (primeiro) comeback de ninguém mais, ninguém menos que Britney Spears, a eterna Princesa do Pop. Seria a primeira apresentação ao vivo de Britney depois de anos aparecendo no noticiário não mais por sua música, mas pelo desequilíbrio de sua saúde mental. Britney colapsava em público e todo mundo fingia ser “mais uma esquisitice desse povo famoso” ou uma “excentricidade”. Mesmo jovem, lembro bem de sacar na hora que ela estava mal, muito mal. Mas mentiria se dissesse que, até aquele momento, eu não era mais um dos milhões de fãs mundo a fora torcendo pela volta às paradas e aos palcos. Então não é exagero dizer que meu coração teen e pop parou quando os primeiros acordes de “Gimme More” soaram e Britney subiu ao palco: E também foi exatamente aí que meu coração voltou a bater, rápido, tentando entender o que eu via. Britney usava um tipo de biquíni nude e um par de botas; seu corpo, sempre em evidência em suas performances, estava diferente; o alongamento dos cabelos (raspados por ela mesma pouco mais de 1 ano antes) parecia ter sido feito por um mecânico, mas nada disso, absolutamente nada disso teve importância quando Britney começou a… dançar. Veja bem, foi a primeira vez que o mundo viu o quão o estado de Britney era sério: Aquilo que ela fazia de melhor, que fazia literalmente com os pés nas costas, que era dançar, estava completamente comprometido (hoje sabemos, para sempre). Ela estava visivelmente sob efeito de tarja-pretas pesadíssimos (ministrados a pedido do pai, como seria descoberto mais de 10 anos depois): Ela estava lenta, insegura, cambaleante, olhar entorpecido, o corpo de baile assustado, literalmente a guiando e a segurando por todo o palco, o mesmo palco onde Britney brilhou pelo menos 3 vezes antes (apresentando “Ooops, I did it again”, “I'm A Salve 4 U” e a antológica ao lado de Aguilera e Madonna). Na platéia, estrelas como Timberlake, Rihanna, Snoop e outras do mesmo quilate, se alternavam entre o deboche e o mais absoluto choque. Lembro que passei toda a apresentação dizendo ao telefone “Amigo, o que é isso? O que fizeram com ela?”. Quando a apresentação acabou e já falavam em um “novo comeback” (que seria o "slogan" de TODOS os lançamentos de Britney nos quase 13 anos de tortura que se seguiriam a essa apresentação), eu disse para meu amigo, lá nos jurássicos 2007, através do primitivo telefone, ouvindo sua respiração ofegante do outro lado da linha:
“Ela precisa parar.”
Foto: Divulgação
Não fui o único a achar isso, mas, pelo o que vejo até hoje, com as reações à última postagem de Britney (03.01.2014), ainda somos minoria. As pessoas chegam a 2024 achando mesmo que a Britney tem obrigação de lançar hits e fazer turnês para que nós nos sintamos mais seguros, mais confortáveis? Sério que tem alguém aí fora achando “Ah, agora que a Britney voltou a gravar singles o mundo voltou para o lugar”? Tornar o seu mundo mais seguro ou confortável é um trabalho seu e de mais ninguém. Ok, talvez também do seu terapeuta.
Na verdade não é nada complexo ou difícil de entender: Imagine que seus pais, na sua infância, um dia acordam e decidem quando e onde você irá trabalhar; decidem que sua rotina será a de ida do trabalho para casa e da casa para trabalho sem nenhum tipo de socialização que não seja a escolhidas por eles; decidem que todo seu faturamento vá para a mão deles e que você precise pedir “pelo amor de deus” até para comprar uma cueca; imagine ouvir seu pai transando com 4 prostitutas pagas com o dinheiro do seu trabalho enquanto seu celular é de 2009? Agora imagine que 13 nos se passaram assim. Um dia, você tem a oportunidade de sair desse lugar para sempre: Você escolheria voltar? Pensa direitinho antes de responder, independente da opinião que você já tenha sobre a Britney, falando aqui de você, você:
Você voltaria?
Sabemos que não.
O show bussiness é esse lugar para Britney, essa “casa para nunca mais se voltar". É assim desde 2007. É um lugar de dor, de mais lembranças ruins do que boas, um lugar para não voltar enquanto se puder evitar.
Parafraseando Britney e uma de minhas músicas favoritas, “Circus”, 🎵"existem dois tipos de pessoas no mundo”🎵 as que só conseguem enxergar uma quarentona desequilibrada e no limite dançando perigosamente com facas no Reels, e aqueles que, como eu, vêem uma fugitiva recém liberta de seu cativeiro tentando desesperadoramente, se não recuperar, aprender a resignar-se com a perda de 13 anos de sua vida que lhe foram roubados pelo seu próprio pai. Britney não está “suicida”, Britney está sedenta. Deixe-a matar a sede. Não era isso que você queria? Free Britney, right? Não é isso que todo “fã de verdade” deve desejar, que sua Diva esteja bem? OU na verdade você quer mesmo é determinar o que ela deve fazer com a liberdade dela? Bem, mais aí você está mais para Pai do que fã da Britney, não?
Liberdade não é o momento em que o prisioneiro atravessa os portões do cativeiro rumo a rua, mas o quão livre o liberto conseguirá ser depois disso.
Chegamos em 2024 e Britney ainda precisa ir às redes - depois de inventarem que ela estaria envolvida numa série de colaborações com algumas das estrelinhas do momento - para dizer, mais uma vez, "chega”(!). Em sua última postagem Britney afirma com todas as letras o que tenta dizer desde 2007: que “jamais voltará para a Indústria da música”.
Como o então viral Chris Croker dizia, ou melhor, gritava - com direito a rímel preto borrado de lágrimas e tudo, quando a mamãe YouTube gerava, sem que nem ela mesma soubesse, os primeiros TikTokers - lááááá em 2007:
"Leave Britney Alone!”
(Deixe Britney em paz!)
Principalmente quando a "paz" escolhida por ela não for a que você escolheria.
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